17 April 2007

A Excêntrica Família de Lewis



Os blockbusters "filmados" andam tão ruins, tão à base de carros velozes, hip hop barato, manos e minas, que está acontecendo o inevitável: a discussão de questões existenciais num nível pop está migrando cada vez mais para os filmes de animação (tem também os filmes de comédia, mas isso é assunto pra outro post).

Nesse sentido, A Família do Futuro é um caminhão de pequenas dúvidas contemporâneas interligadas de forma não-linear para construir, no fim das contas, uma estrutura aceitável e tranqüila de existência. Peraê, o que eu disse? Que finalmente alguém captou um pouco do caos da vida moderna, bateu no liquidificador e conseguiu retirar dali um clássico final feliz Disney-americano-empreendedor. Os caras são bons, hein?

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A história: Lewis é órfão e adora inventar aparelhos eletrônicos pra melhorar a vida das pessoas. Numa feira de ciências, ele é abordado por um garoto que veio do futuro pra salvar Lewis de um vilão do futuro. Lewis vai, se encrenca e começa uma aventura à base referências pop futuristas (matrix, phillip k dick, jetsons), elipses de tempo, questionamentos acerca de maternidade, família e moral, tudo isso se enrolando e desenrolando numa insana velocidade. Nunca vi um filme infantil com as crianças tão quietas durante a projeção. Das duas uma: ou elas não estavam entendendo nada ou estavam entendendo tudo.


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Lewis foi adotado e encontra uma nova família, absolutamente maluca no dia-a-dia e "maluca" nas conexões afetivas: poucos são parentes "de sangue", a maior parte acabou reunida por sua excentricidade ou por sua paixão em comum: a criatividade. Extremamente simbólico quando as instituições familiares clássicas parecem estar ruindo ou querendo ruir para abrir espaço para novas interações - que também sabe-se lá se vão dar certo ou onde vão parar. Como o filme termina bem no momento da felicidade geral da nação, a gente nunca sabe as consequências.

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A mensagem Disney de "imagine, lute e vai acontecer CERTO" não é esquecida. Nesse sentido, a suposta loucura do filme é contrabalançado com a boa e velha (e segura) filofosia ianque. Não importa nada, não interessam as condições externas, se VOCÊ se esforçar e trabalhar DURO, você VAI chegar onde quer. É um pouco scary diante de certos caprichos inevitáveis do universo (impermanência, por exemplo), mas confesso que também acho bom pra temperar a indolência latina.

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O lema do cientista do futuro no filme é "Siga em Frente" e um curioso libelo pelo fracasso acompanha esse mantra. Tem uma cena engraçada na qual Lewis fracassa com um invento e toda a "família do futuro" comemora o fracasso como uma etapa pro sucesso final jogando bebida na cara.

Louvável a atitude de aceitar o fracasso. Temerosa a idéia de que o sucesso é sempre garantido para os que se esforçam. A noção de justiça é muito presa a questões temporais e morais ainda.

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Independente disso, como tu pode ver, A Família do Futuro rende um monte de boas reflexões. Mas eu posso também estar enganado. Pode ter sido tudo o efeito da overdose de pipoca.