Poder Cultural e Institucional
O post abaixo sobre a China me lembrou um outro assunto que eu queria conectar. Na verdade, é meio que continuação de outros posts.
Eu estou sempre aqui querendo questionar clichês que envolvem a publicidade, então vamos a mais um deles: o do poder absoluto de um comercial. Eu mesmo sempre pensei nos comerciais e anúncios como donos de um poder realmente incrível, de convencer verdadeiras multidões a comprar coisas que talvez elas não precisem etc. e tal. Você conhece o papo.
É muito comum nas agências nós fazermos campanhas beneficientes para causas como combate à Aids, doação de sangue, doação de comida, doação de dinheiro, doação do que quer que seja, ou conscientização a respeito de algum assunto "social". Geralmente esses lances não dão em nada muito concreto. Embora as campanhas mexam com algumas pessoas, é raro ver uma mudança em grande escala acontecendo por causa de uma campanha social.
Muitos publicitários podem até contar grandes histórias sobre as suas campanhas, mas eu honestamente nunca vi uma campanha beneficiente ter o mesmo poder de uma campanha comercial. Por que isso?
A resposta é lógica: porque campanha nenhuma funciona sozinha.
Os leigos não sabem, mas campanhas publicitárias são uma das pontas visíveis de ações maiores e mais complexas que envolvem não apenas outras ferramentas de marketing (promoção, relações públicas, assessoria de imprensa, etc, etc, etc) mas também fatores como distribuição dos produtos nos mercados, contextos sociais e econômicos, etc.
Por exemplo.
Para você convencer alguém a comprar um Audi, um anúncio é muito pouco. Aquele anúncio de Audi, ou seja lá qual for o carro, precisa ser acompanhado de uma complexa operação de marketing que envolve tudo aquilo que eu citei ali em cima. Mas tem mais coisa: o tal anúncio de Audi se beneficia de toda uma cultura de veneração de carros e velocidade, um espécie de membrana social que atravessa muitas décadas de história e é ligado a desejos sutis das pessoas relacionados a esse tipo de assunto. Ou seja, além de toda a história da psicologia do "gostar de carros", o tal anúncio da Audi se beneficia de todos os outros anúncios de carro porque, em última análise, todos eles valorizam o fato de você ter um puta carro.
(Vamos esquecer aqui julgamentos de mérito a respeito da importância do carro na vida da pessoa, questões poluentes e esse tipo de coisa)
Entendeu o que eu quis dizer?
Para uma campanha social ter um puta retorno realmente relevante, seria preciso haver todo um segmento amadurecido e comprometido com essa causa. A indústria automobilística, com sua concorrência, impulsiona o segmento de carros. E isso raramente acontece no "meio social" porque as ações não são orquestradas. Não há dinheiro suficiente para isso, não há organização, não há consciência da importância, a desculpa realmente não importa aqui, o que estou levantando é a estrutura de funcionamento.
Um anúncio solitário não faz grandes mudanças na vida de ninguém, seja ele do que for.
Ah, ia esquecendo de dizer o que isso tem a ver com a China... olha, isso é bem comentário sem grande conhecimento de causa, ok? Realmente não saco desses assuntos direito.
Mas é que eu estava pensando que as pessoas valorizam demais as revoluções culturais que intencionam fazer... achando que uns cartazes, uns grafites e uns fanzines vão mudar o mundo.
Países como a China, ou mesmo Cuba, são lembrados pela intensidade de sua revolução cultural. Mas o que leva a coisa toda adiante não é a cultura (esse tecido altamente permeável) e sim o poder institucional, político e militar.
Ou seja, idéias são boas e legais, mas são ações intitucionais que de fato mudam o mundo.